Torcendo pelo bandido
Jolivaldo Freitas
Hollywood ficava de olho grudado no roteiro, conferindo e buscando com lentes de aumento as entrelinhas e principalmente o final dos filmes por que era terminantemente proibido bandido vencer no derradeiro take. Era preciso dar a lição. O bem sempre vence o mal. Se John Wayne sempre sofria do início ao meio e depois começava a vencer, é que ele representava o bem. O mesmo com A família da Fazenda Bonanza, ou o Homem do Rifle, sem falar que até animais praticavam o bem como Lassie e Rin Tin Tin. Até Bufalo Bill era tido e havido como paladino da justiça e somente anos, muitos anos depois foi que a história mostrou sua verdadeira face de devastador da vida indígena. Até o FBI de J. Edgar Hoover cuidava de espremer a pena dos roteiristas hollyudianos. Quem saísse da casinha a que estava confinado era banido do cinema e da TV.
No Brasil da ditadura militar era a mesma coisa e o bem não podia vencer o mal nem em novelas. A situação continuava mesmo após a queda do regime militar e sua censura. Havia a autocensura. Tanto que Reginaldo Faria, no papel do vilão Marco Aurélio na novela “Vale Tudo” do final dos anos 1980, depois de aprontar todas como vilão, fugiu do país em um avião levando sua fortuna e deu uma “banana” para o Brasil, debochando dos brasileiros e das autoridades foi comemorado – não como algo a ser seguido -, mas de enfrentamento à hipocrisia nacional, abrindo um novo caminho de liberdade de expressão. O Brasil, na vida real tinha muitos violões se dando bem, no final, por baixo do pano.
Hoje o Brasil se encontra numa situação de total hipocrisia e algumas vezes de imersão na esquizofrenia. O Brasil não tem mais mocinho para se torcer a favor. O Brasil só tem vilão e não venha me dizer que Lula é mocinho, pois seu perfil é outro. Bolsonaro é outra espécie de bandoleiro. Não tem inocente no STF e se o Texas Ranger Division cercasse o Congresso Nacional não haveria cavalo suficiente, nem algemas, para levar tanta gente. Um ou outro escaparia, mas nunca que o Centrão e seu líder máximo Arthur Lira, presidente da Câmara.
Daí que o filme “Brasil” fica difícil de ser escrito e se fosse produzido a plateia não ia entender como é que um roteirista faz uma película em que só tem bandido e não tem mocinho para combater o mal. As disputas na tela seriam apenas e assemelhadas ao que ocorre em várias cidades, em que na falta de polícia as gangues se enfrentam ou enfrentam gangues de milícias. Hoje está assim o país: um ex trocando tiros com um atual presidente. Briga de filme B de faroeste. Sem final feliz. Só chamando John Wayne ou Jerônimo nosso herói do sertão. Serve também o Vigilante Rodoviário. Seria melhor Mazzaropi.
Escritor, jornalista e filósofo: Jolivaldo.freitas@yahoo.com.br