A grande incógnita é o candidato do Centrão, que governará o país
Gerson Brasil, secretário de Redação da Tribuna
O Centrão, o partido inexistente, mas que governa a política nacional há décadas, está à procura de um candidato, é uma das peculariedades da política brasileira, algo que se fixa em paralelo à lei, mas é reconhecido pela sociedade. Bolsonaro pode se tornar o candidato do Centrão, dentro das regras do jogo, o acordão. Não é uma novidade e sim uma das condições do chamado governo de coalizão de 34 partidos. A refrega política, a alternância do poder e até mesmo os processos de impeachment dão uma legitimidade bastarda ao sistema, mas não é extraterrestre.
Quando as divergências tornam-se belicosas apela-se para a Democracia, mas nem os liberais abraçam a Democracia, nem os esquerdistas, nem os reacionários. O empresariado procura se mover num mercado mais ou menos livre, conquanto a acolher o subsídio, ou privilégio ou os dois ao mesmo tempo. A redução da tributação de lucros e dividendos de 20% para 15% causou indignação, com a pregação bíblica de que o Capital não mais procuraria o Brasil. O Senado ainda não se posicionou misericordioso, ou dura lex, sed lex.
Estamos distantes de uma Democracia capitalista burguesa, ao contrário; fortes traços do Sistema Colonial Escravista persistem, regem as relações econômicas, políticas e culturais. Como diz Wanderley Guilherme dos Santos, em “Razões da Desordem”, “a instauração da República redefine as regras da competição política intra-elites”. Nas sociedades capitalistas, o pacto também se dá entre as elites, mas as lutas populares e as conquistas constitucionais acordadas e respeitadas, impulsionam os processos de liberalização e participação, de grandes parcelas da população na sociedade, mas, sem simetria e com muito embate. É sempre conflito. David Hume observa que se as restrições e obrigações previstas na Constituição forem para inglês ver, desaparece a institucionalização da sociedade. Cada poder, cada instituição, interpreta a Lei como Luiz XIV, manda quem pode, obedece quem tem juízo.
Se Jair se tornará palatável é uma incógnita. A disputa política está fervendo, com cunho religioso e ofensivo. Se os outros partidos vão fincar um candidato não se sabe.
Reformas precisam ser feitas, mas o cálculo eleitoral está à frente. Busca-se um candidato de centro, mas precisará ter o apoio do Centrão. Lula está à procura de um mandato, para o PT reeditar a magia, aquela em que o consumo puxa a produção, ou a chamada nova “matriz macroeconômica”. Em 2014, a média anual da população desocupada foi estimada em 1,176 milhão de pessoas, mas em 2016 Dilma entregou 12 milhões de desempregados, e não havia pandemia. Depois veio Temer e agora Bolsonaro e estamos com 14 milhões. A indústria já não tem a pungência dos anos 70, e na análise de Celson Ming, “setor desfruta de incentivos fiscais e de privilégios tributários quase permanentes”. Muito se fala em Democracia, contraditoriamente aos berros e com xingamentos. Cortázar, em “Fábula sem Moral”, relata a profissão de um homem que vendia gritos e palavras e tentou vender a um homem de Estado. Este ficou desconfiado e mandou prendê-lo. “Mas esses gritos vendidos nas esquinas se tornaram a senha de uma contrarrevolução. Sobas e ministros foram defenestrados do poder. Alguns deles pensaram que na realidade pode-se vender gritos, mas não se pode comprá-los, embora pareça absurdo”. Uma arguta observação. Mas os brasileiros tão amáveis e sensíveis gostam de se vangloriar que “ganhou no grito”. Vamos ver quem vai berrar mais alto. No Youtube, João Donato no Sesc e a exuberante Amazonas. Preste atenção no contrabaixista Luiz Alves – rege o quarteto – e no número de brasileiros que têm deixado o país.