O CEBAS EM CHEQUE MATE
Estamos assistindo um momento desafiador para os atores envolvidos com a saúde, em especial para a rede filantrópica, dependentes que somos do Sistema Único de Saúde – SUS, na minha opinião, o melhor sistema de saúde pública do mundo, no qual a rede filantrópica se encarrega de protagoniza-lo com 54% de toda a assistência hospitalar prestada.
Durante 30 anos, o poder público, nas suas três esferas, se acostumou a chamar essa rede filantrópica, de melhores parceiros, de parceiros estratégicos, de essenciais ao SUS, certamente mais preocupados em transformar esses afagos, em elevação da auto estima de seus dirigentes e representantes, do que demonstrar de fato, a consciência de sua importância, pois se assim fosse, teriam tomado providências para coibir as práticas de usurpação, através de um subfinanciamento imposto e conveniente, diante da economia que lhes proporciona, mesmo sabendo que se dá concomitantemente com o endividamento de todos e fechamento de alguns dos seus chamados “melhores parceiros”.
Não bastasse o endividamento do setor filantrópico para se manter vivo, sem o equilíbrio econômico e financeiro exigido pela Lei nº 8.080, impondo prejuízo aos contratados, exatamente como tenta impedir a Lei nº 8.666 de Licitações e Contratos, e prestando um serviço que constitucionalmente, é do Estado, criaram outros regramentos legais, através de lei ordinária, que estabelece contrapartidas para a concessão e manutenção dos benefícios fiscais sobre contribuições sociais.
Ocorre que o STF, recentemente, julgou várias ações diretas de inconstitucionalidades (ADI), posicionando-se a favor de que certas exigências não serão mais necessárias na educação e na assistência social para obtenção do Certificação de Entidades Beneficentes de Assistência Social (Cebas), a exemplo da recente decisão provocada pela ADI 4.480, na qual o plenário do STF decidiu que é inconstitucional a exigência de certas contrapartidas materiais para obtenção da Certificação de Entidades Beneficentes de Assistência Social (Cebas) nas áreas de educação e assistência social como requisito para imunidade às contribuições para a Seguridade Social.
Será que o STF deixou de fora a saúde? Será que justamente a área que mais sofre imposição de prejuízo, com serviços contratados e referenciados por uma tabela de procedimentos que nos 30 anos teve uma estimativa de reajuste linear médio de 93% diante de uma inflação de mais de 1.000%, sem chance de repassar os custos da gratuidade e do déficit aos outros clientes pagantes, se manterá sob regramento desta mesma lei ordinária e questionada pelo STF ? Ou será que o STF se valeu do fato de que o governo e a legislação considera com “Entidades beneficentes em Assistência Social” as entidades sem fins lucrativos que atuam em educação, assistência social e saúde, como prevê a própria certificação – CEBAS ? De uma forma ou de outra, a ADI 4.891 que cita especificamente a saúde com o mesmo propósito, quanto a exigência de percentual mínimo de prestação de serviços ao Sistema Único de Saúde (SUS)será julgada breve.
Considerando o cenário atual e a ausência da modulação de efeitos da inconstitucionalidade resultante da ADI 4.480, surgem varias reflexões para todos os atores da saúde e do SUS.
Os entes públicos irão se manter de olhos fechados diante desses julgamentos do STF e manterão suas práticas de perpetuar a relação danosa até então existente, e sentar em terrenos minados para explodirem a cada ação judicial julgada em favor dos prestadores explorados, que agora se travestirão de legítimos reclamantes? Tentarão copiar o conteúdo da Lei Ordinária nº 12.101 e colar em um Projeto de Lei Complementar, ignorando os direitos básicos já pacificados de imunidade e não de isenção como o governo quer? Ou acordarão e finalmente começarão a construir, a quatro mãos um novo Marco Regulatório do Setor Filantrópico com as condições justas, recíprocas e capazes de estimular de forma espontânea o aumento da participação dessa rede no SUS, sem que represente aumento de prejuízo e sim ampliação da assistência e do direito mais imprescindível do cidadão, a Saúde.
Os representantes do setor filantrópico vão aproveitar esse momento para se reposicionar diante de seus direitos ratificados pelo STF? Ou vão esperar mais uma vez, a iniciativa do poder público? As pedras estão colocadas no tabuleiro.
Que vençam: a lei, a justiça, a coerência e o interesse coletivo.
Mauricio Dias
CEO e Consultor Sênior da Condias Soluções em Saúde
Ex Vice Pres. da Confederação das Santas casas e Hospitais Filantrópicas do Brasil – CMB