Os liberais e a indexação do crédito imobiliário
Gerson Brasil , Secretário de Redação da Tribuna
29 de agosto de 2019
O Brasil liberal de Guedes e do presidente da Caixa, Roberto Campos Neto, acaba de contribuir com a indexação da economia, medida que vai de encontro à concepção de desregulamentação do mercado e extinção de artifícios para sustentar preços.
Estou falando da correção dos financiamentos imobiliários pela inflação oficial, IPCA, mais juros entre 2,95% e 4,95% ao ano. O avô de Neto, o economista Roberto Campos, era contrário à indexação, por entender tratar-se de um problema. Até então vinha o governo se pautando por medidas estruturantes, a exemplo da reforma previdenciária e agora com as primeiras discussões sobre a reforma tributária.
Se há confiança de que daqui para frente a economia caminha para a estabilidade, com inflação controlada, preços relativos sem anomalias, por que indexar o crédito imobiliário à variação do IPCA? Por que não baixar os juros dos financiamentos?, afinal temos Selic a 6% ao ano, com indicativo de 5%.
Quanto menos índices, para proteger os preços, melhor será o desempenho da economia. A indexação é uma medida de desconfiança e de proteção do preço, estabelecido no contrato, contra uma possível desvalorização ao longo do tempo, em razão de uma peste inflacionária que venha a se alastrar na economia.
Ainda bem que o governo não baixou um decreto, não legislou, como é comum – na intenção de marcar ponto ou impor regra; inicialmente na canção de biscoito de goma, mas logo adiante surge a palmatória do rícino, maná e sena.
É certo que o governo vem sendo bastante criticado por não estabelecer medidas ou mecanismos que gerem postos de trabalho; uma mágica. Isto porque se deve reconhecer que o desemprego ainda está muito alto e a economia não mostra sinais de recuperação na medida da expectativa dos trabalhadores e dos empresários.
O risco da operação financeira imobiliária com crédito indexado torna-se maior, porque ela está atrelada à inflação flutuante. Mas à primeira vista, esse mecanismo parece vantajoso, principalmente para quem tem renda e pode quitar o imóvel num prazo curto, 5 a 8 anos. Mas é preciso observar que o saldo devedor será corrigido pela inflação e dividido pelo número de parcelas. No modo atual dos financiamentos, o saldo devedor é corrigido pela TR, hoje praticamente zerada. Em dezembro de 2014 a inflação exibia 6,4%, contados 12 meses, e em 2015 subiu para 10,6%. O IPCA nos últimos 12 meses crava 3,22%, um sonho de valsa, ou um pôr do sol na cobertura do Fera Palace.
Para o grosso do mercado consumidor, a classe média, assalariada, cujo poder de alienar parte do holerite não é tão grande, a operação exige muitas contas, boa disciplina fiscal, sorte, ou rezar para o danado do IPCA ficar quieto. Ao instalar a indexação, os liberais não estão convictos que a economia venha a se estabilizar, acreditam, desacreditando, é a convicção que não se convence, dada talvez a inércia do pensamento ou, como diz o narrador de no Caminho de Swann, “a imobilidade das coisas que nos cercam talvez lhes seja imposta pela nossa certeza de que de que essas coisas são elas mesmas e não outras, pela imobilidade do nosso pensamento perante elas”. Bom, com ou sem liberais, mas sem esquerdistas, vinho ou dry Martini realça a inda mais Stardust, na voz e no trompete de Andrea Motis. YouTube.