Outubro Rosa: quando prevenir não é mais possível, combate ao Câncer de Mama passa a ser o foco
A vendedora Rosana Santos (36), solteira, quarta filha de cinco irmãos, integra uma família unida que vive na cidade de Irecê, localizada a cerca de 480 quilômetros de Salvador na região centro norte da Bahia. Certo dia, enquanto tomava banho antes de sair para trabalhar, tomou um susto quando, durante o autoexame da mama direita, descobriu um “caroço” grande. Sem perda de tempo, correu para uma consulta médica, em que foi orientada a fazer os exames de ultrassom, mamografia e biópsia. A espera pelo resultado, que parecia eterna, acabou no dia do seu aniversário, quando descobriu que estava com Câncer de Mama. Sua primeira reação foi chorar e se lamentar, como acontece com boa parte das pacientes no primeiro momento após a descoberta da doença. Mas não demorou para ela se levantar, reunir a família, dar a notícia com esperança de cura e partir para a capital do estado, a fim de iniciar o tratamento.
A partir daí, Rosana passou por lutas, mas não sozinha, como ela faz questão de frisar. “Deus me presenteou com pessoas e profissionais maravilhosos, como a oncologista Renata Cangussu e as demais integrantes do grupo ‘Mulheres na Oncologia’, que sempre me animaram quando eu queria entregar os pontos. Passei por uma cirurgia, quimioterapia que me deixou careca, fiquei bastante inchada por conta dos corticoides e fiz teste genético que confirmou a causa hereditária da doença”, contou. A vendedora fez a mastectomia bilateral (retirada das duas mamas) e foi neste momento que ela viveu a pior parte da sua luta: a rejeição do corpo a uma das próteses mamárias.
“Não foi fácil, pensei que não iria resistir. Perder as mamas foi difícil, pois elas simbolizam o feminino. Meu casamento desmoronou. Mas, sabe o que fiz? Levantei a cabeça, dei a volta por cima e, com o apoio da minha família, resolvi mudar meu estilo de vida para viver mais e melhor. Perdi 25 quilos, treino duas horas por dia praticando crossfit e corrida, trabalho normalmente. Hoje, estou curada e sou inspiração de vitória para as pessoas da minha cidade. Acredito muito que a vida tem que ser aproveitada ao máximo. Quando nos deparamos com a possibilidade de morte iminente, valorizamos o acordar, o respirar, as coisas mais simples e até aqueles sonhos que estavam adormecidos. Hoje, sei que não devemos nos acomodar, precisamos de desafios e de movimento, pois o tempo voa e a vida é trem bala”, declarou Rosana Santos.
Superação – Esta experiência ilustra bem a mensagem de superação que precisa circular ao longo do Outubro Rosa, mês de conscientização do câncer de mama. Afinal, quando a prevenção e o diagnóstico precoce não são possíveis, não é o fim e sim o início de um combate que pode ter um final feliz. “A mensagem de prevenção, porém, precisa circular muito também, já que até 40% dos tumores de mama podem ser evitados”, declarou a oncologista Renata Cangussu, presidente da Sociedade Brasileira de Oncologia – seção Bahia (SBOC-BA). Segundo ela, para isso, é essencial aderir a hábitos saudáveis, como manter-se dentro de um peso adequado, ter uma alimentação equilibrada, praticar exercícios físicos regularmente, não fumar e evitar o consumo de álcool. Além disso, mulheres a partir dos 40 anos ou a partir dos 35, quando há histórico familiar de Câncer de Mama, precisam fazer a mamografia anual para rastreamento da doença. “Nunca é demais lembrar que o diagnóstico precoce é muito importante, pois quando diagnosticado precocemente o tumor de mama pode ser curado em mais de 95% dos casos”, frisou.
A médica lembra que, devido ao isolamento social imposto pela pandemia de Covid-19, houve uma grande redução no número de mamografias realizadas no Brasil. “Considerando apenas as mulheres entre 50 e 69 anos atendidas pelo Sistema Único de Saúde (SUS), de janeiro a junho de 2020, tivemos uma redução de 67% em relação ao mesmo período do ano passado”, frisou. Muitas pacientes, principalmente aquelas acima de 60 anos, deixaram de comparecer às consultas, impedindo que os tumores fossem detectados na fase mais adequada. O resultado disso foi o crescimento desses tumores, infelizmente.
Mulheres na Oncologia – A doutora Renata Cangussu é uma das três integrantes do grupo “Mulheres na Oncologia”, formado por médicas que atuam juntas na luta contra o câncer em Salvador. Há alguns meses, elas se uniram em torno de desafios e objetivos comuns, tais como combater as diferenças de oportunidades no trabalho decorrentes do gênero e ampliar o acesso das pessoas a serviços de saúde de qualidade. De acordo com outra integrante do grupo, a oncologista clínica Samira Mascarenhas, “viver um sonho sozinho pode ser bom, mas ter ao lado pessoas que vibram com suas conquistas é muito melhor. Um dos sonhos que temos em comum é que as pessoas possam ter acesso à saúde de forma integral. Juntas, batalhamos por isso”, frisou.
Para a radioterapeuta e também integrante do “Mulheres na Oncologia”, Elisângela Carvalho, o projeto do grupo inclui colaborar para o equilíbrio entre a vida pessoal e a profissional. “Sou casada, mãe de uma menina e minha batalha para equilibrar todas as áreas da vida é diária. Por vivermos isso na pele, fazemos questão de ajudar as pacientes que, como nós, assumem múltiplos papéis com dedicação e resultados positivos”, contou. Embora no Brasil o número de mulheres (51,7%) seja superior a dos homens (48,3%), elas ainda são minoria na medicina e recebem menos fazendo as mesmas atividades, simplesmente pela questão de gênero. Diante desta realidade, o grupo também abraçou como foco a busca pela equidade. “Um dos nossos propósitos é contribuir para o combate à esse cenário de inferiorização das profissionais médicas. Somos mulheres, profissionais e mães e cumprimos todos os nossos papéis com dedicação e responsabilidade. Também por isso, incentivamos outras mulheres a não desistirem de seus sonhos, mesmo quando o nosso gênero pareça uma barreira”, concluiu a oncologista Renata Cangussu.