Palavra e Memória: a modernidade lírica de Eduardo Boaventura
Eu creio no método, urdidura das coisas e das palavras, naquele percurso que possibilita a manifestação da arte e da retórica de Cícero catalogada como Ingenium, que é talento e criatividade, maturidade em uma determinada linha, ou seja, aqui, o treino dedicado de Eduardo Boaventura.
As conhecidíssimas cinco noções clássicas de Cícero: natura, ingenium, ars, doctrina e studium que, tão distintas, guardam entre si semelhanças semânticas. Embora seja difícil distinguir o que é parte do domínio da natura do que é parte do domínio do ingenium, estamos falando tanto de dotes quanto de disposições naturais de um poeta maduro que bem sabe a respeito da poética que está fazendo em Palavra e Memória.
A poesia de Eduardo Boaventura é constructo original da mordernidade lírica. Sonoridade herdeira de Verlaine, Manuel Bandeira e Mário Quintana, marcada, entretanto, por peculiar e forte sentimento de introspecção.
Semelhanças, dissonâncias e especificidades ao conciliar a justa harmonia entre imagens e ideias suas das quais fala o precursor Mário Quintana: “Não sei que paisagista doidivanas/ Mistura os tons… acerta… desacerta… /Sempre em busca de nova descoberta,/ Vai colorindo as horas quotidianas”…
A poesia de Eduardo Boaventura, isto sim, busca a compreensão do tempo, de sua passagem, bem como a geração e morte das coisas neste tempo. Trata-se da expressão da nostalgia dos amores, dos desejos e dos encontros, diante do implacável transcurso do tempo.
Destarte, Palavra e Memória, de Eduardo Boaventura, só pode ser registro de sua identidade e originalidade que se desenvolve através dos demarcados princípios formais de sua poética.
A memória é o maior patrimônio humano e estamos tratando da memória que se expressa pela palavra poética; cultura através do trabalho que, segundo Marilena Chauí, traz à presença as coisas antes ausentes.
Logo, não bastasse constituir a expressão do talento, ler Eduardo Boaventura é saborosamente defrontrar-se com a imortalidade mágica de um mestre da métrica. Paráfrase a Rubem Alves à qual são acrescentadas as importantes conclusões que se aplicam à retórica de Cícero ou, como diria Eduardo: Apontamentos para uma história universal “O que o tempo guardava porque sempre desconhecia/ e que a memória recordava, porque de nada sabia”…
Algo similar ocorre com as outras três palavras. Todas elas, ars, doctrina e studium, podem designar um estudo, uma forma de conhecimento, e podem apresentar, em dados contextos, significados extremamente próximos: “Ensinar é um exercício de imortalidade. De alguma forma continuamos a viver naqueles cujos olhos aprenderam a ver o mundo pela magia de nossa palavra” e Eduardo Boaventura ensina enquanto escreve.
Taurino Araújo, advogado, escritor, professor e lifementoring consultant. Da Associação Bahiana de Imprensa (ABI), do Trissecular Instituto dos Advogados da Bahia (IAB-BA). acadêmico@taurinoaraujo.com