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Salvador e o CAF

A Lei 9.296/2017, aprovada pela Câmara Municipal de Salvador, por maioria, autorizou o Poder Executivo a contratar operação de crédito externo junto ao Banco de Desenvolvimento da América Latina e Caribe (CAF) no valor de sessenta milhões e setecentos mil dólares para destinar os recursos ao Programa de Requalificação Urbanística de Salvador – PROQUALI. Alguns ajustes foram promovidos pela Lei 9.370/18, quando o contrato de empréstimo foi celebrado em 18/12/18 em Brasília, prevendo a requalificação dos trechos da orla e implantação do Museu da Música e do Arquivo Histórico Municipal.

O fato inusitado é que uma parcela dos recursos destinados ao PROQUALI, proveniente da operação de crédito com o CAF, foi utilizada pela Prefeitura de Salvador para ações e serviços à Saúde Pública do Município, relacionados à pandemia de COVID-19, no valor de cinco milhões de dólares. Em maio de 2020, a Lei 9.526/2020, aprovada pelos vereadores, autorizou o então Chefe do Executivo a utilizar os cinco milhões de dólares, oriundos da operação de crédito externo, para outra finalidade, distinta da previsão contratual.

A mensagem enviada ao Legislativo à época ressaltava que as instituições financeiras internacionais, com as quais a Prefeitura Municipal de Salvador já tinha realizado operações de crédito, incluindo entre essas o CAF, haviam sinalizado a possibilidade do direcionamento de saldos remanescentes das operações de empréstimos para as ações relativas ao controle e prevenção do COVID-19. Mas no arquivo da documentação no Senado não há qualquer menção a esse fato.

Acrescentava ainda que a Comissão de Financiamento Externo (COFIEX) do Ministério de Planejamento Orçamento e Gestão do Governo Federal havia exarado a Resolução 02/2020, possibilitando a aplicação dos recursos remanescentes no combate à pandemia. Mas essa resolução não foi apresentada. Destacava que o saldo remanescente disponível na referida Operação de Crédito do CAF, que destinou verbas para o PROQUALI, seria decorrente da valorização cambial do dólar aliada à diferença a menor do resultado das contratações, podendo, assim, ser utilizado, sem comprometer a execução das metas físicas previstas no escopo do programa.

O curioso dessa operação é que o contrato de empréstimo com o CAF ainda está em execução, conforme registro no Ministério do Planejamento e Orçamento com último desembolso vigente para 24/12/24 e possui exigências rígidas. O Município de Salvador concordou expressamente na cláusula quarta que os recursos seriam destinados a financiar unicamente gastos com o programa, incluindo obras, aquisição de bens e equipamentos, contratação de consultorias e serviços, a comissão de financiamento e os gastos de avaliação do empréstimo. 

O prazo do empréstimo é de 16 anos, incluindo carência de 54 meses e qualquer modificação deve ser feita de comum acordo. A garantia da dívida é chancelada pela União. A dúvida que paira é como houve saldo remanescente em 2020 que pudesse justificar os gastos com outra finalidade se o contrato permanece em andamento até hoje? Como constatar a comunicação e autorização da União e do próprio CAF para a Prefeitura de Salvador direcionar parte dos recursos do PROQUALI a destinação diferente daquela disposta nas cláusulas? São questões que necessitam de apreciação para que se tenha total transparência nos contratos firmados que envolvem significativos recursos na cidade de Salvador.

Karla Borges

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