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Carta aberta ao Sr. Diego Dabove

Prezado Sr. Dabove,

A Bahia é uma terra que abraça os portenhos. Hector Julio Páride Bernabó, nasceu em Lanús, mas, aqui, virou Carybé – mais local impossível, com os seus parças Caymmi, Amado e Vina. O mais baiano dos argentinos, ou vice-versa, tornou-se membro de uma das casas de candomblé mais importantes da Bahia, o Ilê Axé Opô Afonjá, recebendo em 1957, o cargo de honra, para seletíssimos eleitos, de Obá de Xangô.

Carlos Maipah, jornalista argentino, tinha o sonho de viver em um paraíso tropical. Viajante pelo mundo, aqui chegou em 2008. O Mercado Modelo estava fechado, então pegou a lancha para ver o que tinha naquela imensa ilha na Baía de Todos os Santos. Dois anos depois, deixou a sua Belén de Escobar, vendeu a sua parte no El Diario de Escobar, e tornou real o seu sonho de menino em Berlinque, comprando uma casa para veraneio, que depois se ampliou para ser a sua pousada, de nome Coruja Branca.

No próprio Esporte Clube Bahia tivemos uma linha média formidável, nos anos 1940, com Héctor Papetti, Dante Jorge Bianchi e Mario Giuseppe Avalle. No início dos anos 1970 aqui aportou “El Nene” José Sanfilippo que nos encantou com o seu futebol-arte, tão bailarino e contundente como um tango de Gardel. E acrobático como os voos do “Batman” dos gramados, o inesquecível Carlos Adolfo Buttice nascido em Monte Grande e que aqui fez também história.

Mas, caro Sr. Dabove, esta missiva não é para falar das muitas afinidades entre a Bahia e a Argentina, mas para lhe dar um aviso de boas vindas.

Caso queira mesmo entrar para a história do primeiro campeão brasileiro – que teve um compatriota seu, Carlos Volante, no jogo decisivo, em 1960 – mude tudo, radicalmente. Venha como um iconoclasta, como um revolucionário Julio Cortázar em “Rayuela”, ou o inquietante Bioy Casares em “A Invenção de Morel”.

Não ouça ninguém, principalmente os da diretoria, que nada entendem deste jogo da bola praticado com os pés. Não preserve nada, mude tudo. Não és milagreiro para transformar água em malbec, mesmo de uma bodega de quinta categoria.

E nem mesmo és um Bergoglio…

Comece a mudança pela lateral-direita: o titular da posição é responsável direto por umas 20 derrotas nas últimas três temporadas. Dizem que ele bate GPS (???), mas não sabe bater na bola, porque não marca nada, cruza mal e chuta mal. Vão lhe dizer que é esforçado; minha mãe também é, mas não serve para lateral do ECB. Na lateral-esquerda, o padecimento é o mesmo. Traga logo dois do Club Luján, do Real Pilar ou do El Porvenir: sei que são da quarta divisão, mas são melhores que os nossos.

A linha de defesa carece de arrumação e, principalmente, de posicionamento. Quem faz -o-quê-onde-e-como. Ou seja, o básico do zagueirismo.

Mude o meio-de-campo todo. Como diria McLuhan: “o meio é a mensagem”, mas o nosso é silente e não liga a defesa ao ataque. Outro princípio básico, não? É uma meia-cancha que não marca ninguém, assiste ao adversário jogar e faz uma transição lentíssima, como “Adiós Nonino” de Piazzolla bailado por dois lutadores de sumô.

No ataque, Gilberto será o seu Luis Fabián Artime ou o seu Gabriel Batistuta, mas é impossível ser feliz sozinho, quando não se tem um esquema tático definido, quando se tem laterais que não praticam o fundamento básico do cruzamento.

O senhor irá ouvir que o clube não tem dinheiro para novas contratações. É parcialmente verdadeiro, porque se gastou “mucha plata” com porcarias, provavelmente empurradas por gângsters do estilo Robledo Puch.

Bote os meninos pra jogar, recrute alguns veteranos para voltar ao clube, como Zé Carlos e Charles, faça qualquer coisa. Mude. Vire-se pelo avesso. Invente. Só não fique na mesmice de manter o que nunca irá dar certo. Será só perda de tempo. Mais tempo.

Qualquer coisa, recomendo que releia Matias Néspolo, em “Sete maneiras de matar um gato”. Tirando a parte da crueldade contra os felinos, o livro nos revela que sempre há mais de um jeito de fazer as coisas, de fazer diferente, saindo do lugar comum e do conformismo.

Obrigado por me escutar, caro Sr. Dabove. Seja muito bem-vindo à Bahia do axé e ao Esporte Clube Bahia que nasceu para vencer. Não quero cantar mais adiante “não chores por mim, Argentina”; prefiro parodiar, para o futuro, os versos de “La Cumparsita” e dizer: “que, ainda dentro de minha alma, conservarei aquele carinho que já tenho por ti”.

Kawó Kabiesilé! – uma saudação que, certamente, Carybé usaria.

Nestor Mendes Jr.
Jornalista

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