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Impossível abandonar o gregarismo, mesmo para combater a covid

Gerson Brasil, secretário de Redação da Tribuna

A Alemanha decidiu estender o lockdown, no país inteiro, até o dia 14 de fevereiro, como medida para conter o aumento de casos e de mortes por covid, e também numa tentativa de barrar a expansão da nova variante do vírus. Na primeira onda, o país fez o dever de casa e conseguiu um certo controle sobre a pandemia.

Veio a abertura do comércio, controlada, a retomada das atividades econômicas e das aulas e junto novamente a covid. O país já vacinou mais de 1 milhão de habitantes, dos 83 milhões, e está fazendo uso da vacina desenvolvida pela farmacêutica americana Pfizer em parceria com a empresa alemã Biontech.

Mas há uma série de problemas. Na primeira onda tinha-se o controle sobre o grupo de infectados, sabia-se onde eles estavam localizados, agora não. Alguns agentes de saúde estão apresentando resistência em tomar a vacina. Quem tem determinado tipo de alergia não pode ser vacinado, porque a reação é muito forte.

Ou seja, a ciência está lidando com fatores adversos e aprendendo com eles. A jornada de vacinação, que já começou, se desenha como longa e de entendimento difícil, mesmo com toda a disciplina alemã.

Não há disputa política pela vacina na Alemanha, nem Angela Merkel está convencida, como Jair, de que a covid seja apenas uma “gripezinha”, nem celebridades fazem festa para 200 ou 500 pessoas.

Mas o vírus tem o mesmo comportamento na Alemanha e no Brasil, com suas festas, eleições, praias lotadas, anúncio de vacina com resultados diferentes, declarações pomposas salvacionistas e uma corrida presidencial enlouquecida.

A vacina tem sido tratada no Brasil como o caminho que leva a cura, assim como a religião é o caminho que leva ao encontro com deus e o apaziguamento das turbulências da alma. Embora a vacina não esteja no ramo da transcendência e sim da materialidade. Assegura-se que libertará as provas do amor pelo próximo, desde que não sejam filhos de Sodoma e de Gomorra, e fará cair as travas do prazeres lícitos e ilícitos, os mais apreciados, mas não confessados, especialmente os da carne. Mas o vírus, ou como o conhecemos, na forma de covid, não inibe propositadamente, ou essencialmente os prazeres, o desregramento. Atua também no ambiente familiar, no aniversário, na reunião ruidosa, do sambão, ou seja, onde se faça presente o gregarismo.

O gregarismo é a proteção contra o abandono, as malvadezas da natureza e da ciência e está na base da constituição do Cristianismo, sedimentado no monoteísmo e na família mononuclear, responsável por grandes alegrias e por grandes desastres do homem, mas nesse caso, no mais das vezes, toma-se o entendimento como uma blasfêmia.

Para além da disciplina, da coação, é o gregarismo o garantidor para que não falte pão na mesa, nem as celebrações, nem as organizações criminosas, nem os partidos políticos, nem as cirandas. A força do gregarismo suplanta a força das escrituras sagradas.

Por mais boa vontade que se despeje no mundo de “meu deus”, renunciar ao gregarismo, é como conceber Ana Paulo Arósio fazendo King Kong, no papel do macaco e não da mocinha, ou querer Dória e Maia como copistas das “Confissões” de Santo Agostinho: “Encarregaram-me de uma tarefa capaz de deixar minha alma bastante inquieta, entre a ambição de louvor e honra e o medo da surra”. É prudente se guardar e se vacinar, para quando o carnaval voltar, mesmo que seja embalsamado, em forma de sereia, num cão sem plumas ou como moscas. No Youtube Arpi Alto no empenho simples e dedicado a Close to You.

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